Acidentes de trabalho: CONTICOM-CUT faz alerta para baixo investimento do patronal em prevenção
Mesmo com setor da construção civil aquecido, entidade diz que empresas seguem gastando pouco para evitar que novos casos fatais aconteçam nos canteiros de obras
Os três filhos de um homem que trabalhava nas obras de um edifício no centro de Guarulhos (SP) ganharam no último dia 18 de março a condição de órfãos. Isso porque o trabalhador, de 57 anos, não retornou para casa após morrer pelos ferimentos sofridos numa queda do 9º andar.
Em janeiro deste ano, pelo menos outros três trabalhadores do setor da construção também não voltaram para casa. No dia 24, um deles foi soterrado em uma obra da concessionária Água de Manaus (AM). Pouco antes, no dia 18, outro trabalhador morreu no desabamento de um telhado, em Campinas, e mais um não resistiu depois que uma escada de concreto se desprendeu da estrutura e o atingiu numa obra pública em Concórdia (SC).
Em fevereiro, a história se repetiu no Espírito Santo, onde trabalhadores do setor de mármores e granitos também não voltaram para casa. Dois deles, jovens de 22 e 31 anos, perderam a vida nos perigosíssimos locais de trabalho onde se extrai, movimenta e beneficia toneladas de rochas. Um terceiro trabalhador morreu de silicose, uma doença ocupacional causada pela exposição contínua ao finíssimo pó resultante do beneficiamento dessas rochas.
Todos eles engrossam uma preocupante estatística que acende um sinal de alerta para a Confederação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores nas Indústrias da Construção e da Madeira filiados à CUT (CONTICOM) justamente neste mês em que é celebrado, em 28/4, o Dia Nacional em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho.
“Temos visto que o setor [da construção civil] tem crescido com a retomada de grandes projetos e grandes obras, mas também tem crescido nossa preocupação porque vemos o patronal investindo pouco para evitar acidentes, seja menosprezando os conceitos de SST [Segurança e Saúde no Trabalho], seja mantendo maquinário obsoleto e estrutura precária. E isso é preocupante num setor que já é naturalmente de altíssimo risco para acidentes”, avalia Luiz Carlos José de Queiroz, vice-presidente da CONTICOM-CUT.
Casos e mortes crescentes
A dor das famílias que não veem seus parentes retornarem dos canteiros de obras – ou voltarem com amputações ou lesões permanentes – parece não dar sinais de que terá um alívio.
Segundo os dados mais recentes divulgados pelo Ministério da Previdência Social, tanto o número de acidentes de trabalho como o de mortes por esse motivo apresentam altas seguidas nos últimos três anos do levantamento (2020, 2021 e 2022).
De acordo com a Edição de 2022 do Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho (AEAT), o setor da construção registrou 42,5 mil acidentes de trabalho, o que representa 6,5% de todos os 648,4 mil casos registrados no país. A edição de 2023 do AEAT deve sair no final deste ano.
Para dirigentes de sindicatos filiados à CONTICOM-CUT, a conscientização é uma das ferramentas para enfrentar esses números preocupantes.
“Temos feito uma campanha forte de conscientização, participando constantemente dos DDS [Diálogo Diário de Segurança] e até contratando um técnico de segurança para melhorar e qualificar a fiscalização nos canteiros. Mesmo assim, sabemos que nas obras menores, algumas até meio escondidas, essa ação fica prejudicada”, explica Marcelo Ferreira dos Santos, tesoureiro da CONTICOM-CUT e presidente do Sindicato da Construção de Guarulhos.
Ainda segundo o AEAT 2022, apenas nas áreas listadas com as CNAEs (Classificação Nacional das Atividades Econômicas do IBGE) ligadas ao grupo “Construção”, em 2022 foram catalogadas 347 mortes, ou seja, 12,2% do total de 2.842 óbitos registrados em todas as áreas de atividade econômica no Brasil.
A evolução desses dados também é foco de preocupação da CONTICOM-CUT. O levantamento aponta que os acidentes de trabalho na construção passaram de 27.495 em 2020 para 36.369 em 2021 (alta de 32,3%), e depois para 42.462 em 2022 (alta de 16,7%).
As mortes por acidentes de trabalho no setor da construção também tiveram evolução semelhante nos três últimos anos do levantamento. Em 2020, 214 trabalhadores do setor não voltaram para suas casas, total que subiu para 289 em 2021 (alta de 35%) e para 347 em 2022 (alta de 20%).
A comparação entre a evolução das mortes por acidentes de trabalho na construção e em todas as atividades econômicas mostra variações percentuais maiores e indica o quanto o canteiro de obras possui um alto grau de periculosidade. Os dados totais do país mostram que foram registrados 2.132 óbitos em 2020, total que passou para 2.717 em 2021 (+27%) e para 2.842 em 2022 (+4,6%).
“O combate aos acidentes de trabalho é uma de nossas bandeiras, com ações como fiscalização nas empresas com relação à entrega de EPIs, oferta de cursos, por exemplo sobre a NR-11, a norma que trata de cargas elevadas, e denúncias ao MPT das empresas onde a gente vê mais falhas. Mas o maior desafio mesmo é convencer o patrão que gastar em saúde e segurança é investimento, e não custo”, explica Pablo Pereira da Silva, secretário-geral da CONTICOM-CUT e diretor do Sindimármore-ES.
A data
O Dia Nacional em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho foi instituído no Brasil em lei de 2005 que determinou a mesma data (28 de abril) que já havia sido instituída, em 2003, pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) como o Dia Mundial da Segurança e da Saúde no Trabalho.
A data foi escolhida pela OIT porque, neste dia, em 1969, 78 trabalhadores morreram na explosão da mina de Farmington, nos Estados Unidos. No dia do acidente, 99 trabalhadores estavam na mina, sendo que apenas 21 deles conseguiram escapar. Os outros 78 mineiros que ficaram presos morreram.